Aposto que esta pergunta já lhe passou pela cabeça em alguns momentos da sua vida. Provavelmente até se está a questionar neste preciso momento!
A vida profissional é sem dúvida, a área à qual continuamos a dedicar mais tempo e energia e através da qual ganhamos o nosso sustento. Por isso quando nos sentimos insatisfeitos, podemos sentir-nos afectados ao nível mental, emocional e até físico e inevitavelmente isso acaba por se repercutir nas outras áreas da nossa vida.
Quando passamos pela insatisfação, sentimos uma enorme turbulência e passamos por várias fases: zanga por nos vermos nessa situação, resistência e desvalorização do assunto porque afinal até temos trabalho e isso devia ser suficiente. Entramos por vezes em negação e tentamos fazer de conta que não está a acontecer. Até que a ruminação mental e as emoções ditas negativas como o medo, a ansiedade, a angústia tomam conta de nós. Contudo, é só num estado de desconforto considerável que começamos a encarar a hipótese de uma mudança.
Quero dizer-lhe que não é preciso chegar a este ponto para perceber quando é chegado o momento de mudar.
Podemos ter em atenção alguns elementos que nos dão pistas para reconhecer que estamos nesse momento. E se assim for, convém actuar o mais rapidamente possível. Pois muitas vezes aguentamos as situações por demasiado tempo e aquilo que se poderia resolver de uma forma simples, pode mesmo complicar-se.
Para facilitar o reconhecimento das pistas que lhe falo, gostaria de partilhar consigo os três pilares fundamentais para uma vida profissional gratificante:
- Actuar sobre os seus interesses, ou seja, sobre os temas que lhe despertam a curiosidade,
- Estar alinhado com a Organização ou com os Clientes com quem trabalha,
- Sentir que tem as características naturais e as competências necessárias ao desempenho do seu trabalho.
Quando estes três pilares estão a ser respeitados, estamos na realização, isto é, actuamos sobre temas que nos estimulam, gostamos do que fazemos e aplicamos competências que apreciamos ao serviço de contextos que precisam e valorizam o nosso contributo.
Quando um ou vários destes pilares se fragiliza, surge a insatisfação. Dependendo de qual seja o pilar afectado, estarão presentes determinados sinais. Por isso, convém saber a que deve dar atenção em cada caso.
1. O que faz não lhe permite actuar sobre os seus interesses
Neste caso poderá ter sensações de apatia, monotonia e até desgaste. Pois na ausência da curiosidade em relação ao que fazemos, entramos numa vivência automática e instrumental para com o trabalho e isso exige esforço da nossa parte. Naturalmente, também irá sentir que não gosta daquilo que faz. Se insistir em manter-se nesse caminho sem nada mudar, alimentará um autossacrifício que não é sustentável a longo prazo.
Este foi o meu caso. Licenciei-me em Química Tecnológica e trabalhei nessa área durante alguns anos. Era um enorme esforço ir trabalhar dia após dia. Questionava-me muitas vezes se a vida não poderia ser mais do que aquilo! Só que insisti por muito tempo nesta escolha por causa da sustentabilidade financeira e para não defraudar as expectativas de outros. Fruto da minha insistência, senti muitos desequilíbrios emocionais e mentais.
Perante a ausência de interesse pelo que fazemos devemos considerar a necessidade de mudar de carreira. No meu caso, eu transitei de uma função técnica de Controlo e Garantia da Qualidade para trabalhar na área da Liderança e Gestão de Equipas. Por obra do destino, assumi esse tipo de funções e reparei que era essa a única componente do meu trabalho que me entusiasmava. Mas eu queria actuar em exclusivo sobre essa componente e deixar para trás o lado técnico da Química e da Qualidade. Foi assim que se deu a minha primeira mudança de carreira.
É então importante que note quais são os temas em relação aos quais quer saber mais. Existem várias formas de saber isso, nomeadamente, perceber que podcasts ouve, que livros lê, que cursos faz, sobre o que é perde a noção do tempo quando conversa com os outros em seu redor. As pistas estão todas aí e será nesse sentido que deve ponderar dirigir a sua carreira.
Comece desde já a ganhar essa consciência para que possa gradualmente dar passos sólidos que o aproximem de um destino mais alinhado consigo.
2. Gosta do que faz, mas sente-se desconfortável com o contexto.
Neste caso trabalha sobre algo que lhe interessa, realiza actividades que gosta, mas existem vários factores no contexto para o qual colabora que lhe causam desagrado. Alguns exemplos podem ser:
- Desalinhamento de valores com o modus operandi da Organização,
- Conflitos ou falta de confiança com a sua chefia, pares ou até com clientes,
- O que lhe pedem ameaça aspectos cruciais para si como o work/life balance,
- Ausência de novos desafios e de investimento na sua formação,
- Inexistência de perspectivas de progressão de carreira,
- Desalinhamento com a equipa com a qual trabalha,
- Condições e benefícios salariais abaixo do que considera adequado.
Se este é o seu caso, então recomenda-se que saia do contexto. Isso pode passar por mudança de emprego ou por mudança de equipa dependendo dos factores em relação aos quais se sinta desalinhado.
O cuidado a ter nesta situação é evitar mudar para a primeira coisa que surge e que o salva da situação em que está. Ao actuar neste modo fuga, vai coleccionar ainda mais factores que lhe trazem desagrado. Assim, estará a aumentar a lista daquilo que sabe que não quer! Em vez disso, deve ter consciência sobre aquilo que espera da relação profissional futura e ser intencional nessa procura. O que costumo dizer é que devemos recrutar e não só ser recrutados. Isso poupa-nos muitas desilusões e previne que criemos a reputação de ‘salta pocinhas’ em que parece que não conseguimos estar muito tempo em lado nenhum!
3. Tem interesse no que faz, gosta do contexto, mas sente-se aquém do esperado.
Nesta situação sentimo-nos verdadeiros impostores. Estamos a actuar sobre os nossos interesses, numa Organização ou projecto que valorizamos só que sentimos que não temos o que é preciso para fazer um bom trabalho. Pior acreditamos que ficamos aquém do desempenho esperado!
Mais uma vez dou-lhe o meu exemplo. Quando fiz a mudança de carreira que acima lhe descrevi, fui trabalhar como formadora de Liderança e Gestão de Equipas. Formava gestores de grandes empresas em projectos considerados estratégicos para os clientes que apoiava. Não imagina o meu pânico a cada novo projecto! Eu achava que não tinha a experiência e a preparação necessárias, mesmo tendo a confiança da empresa que me contratara.
Esta vivência não é nada fácil. Sentimo-nos em défice e inseguros. Estamos em esforço. Mas é um esforço diferente daquele que sentimos no cenário que descrevi no ponto 1, porque queremos dar o nosso melhor e temos medo é de não estar à altura.
Quando estamos nesta situação, o que é fundamental é pedirmos apoio para conseguirmos ultrapassar ou atenuar o impostor que há em nós. Para isso podemos recorrer a formações, a coachs e mentores que nos ajudam a desenvolver os aspectos em que nos sentimos mais frágeis e a melhor responder às exigências da função.
Em síntese:
É fundamental aprendermos com a insatisfação que sentimos no trabalho, em vez de lhe resistir e de a desvalorizar. Insistir numa situação que não nos serve, agrava desnecessariamente o problema.
Agora que sabe que há 3 pilares que contribuem para a sua realização no trabalho, já pode fazer um autodiagnóstico e definir a mudança que precisa dependendo de qual desses 3 pilares se encontre mais fragilizado:
- Se não tem interesse no seu trabalho, repare no que desperta a sua curiosidade e pondere em reorientar a sua carreira no sentido desses temas,
- Se o contexto lhe causa desagrado, evite entrar em modo fuga e identifique as suas expectativas na relação profissional. Procure mudar para contextos que estejam alinhados com estas,
- Se actua em temas que gosta num contexto que aprecia e se sente um impostor, procure apoio para ultrapassar as suas dificuldades.
Posto desta forma até parece simples, não é?
Na verdade é mesmo!
O que nos dificulta lidar com as mudanças na carreira são acima de tudo os obstáculos que colocamos a nós próprios, como a resistência que temos em aceitar o que sentimos e insistirmos em permanecer numa situação que não nos serve.