Tomar decisões de carreira é um processo complexo e, muitas vezes, carregado de emoções. O medo, em particular, pode influenciar significativamente essas escolhas, levando-nos a caminhos que não refletem verdadeiramente os nossos desejos e potencial. Faz-nos tomar decisões mais conservadoras e ter uma maior aversão a riscos, mesmo quando há oportunidades de crescimento evidentes (Kellogg Insight, 2021). 

Durante anos, vi profissionais talentosos e altamente competentes ficarem paralisados no mesmo lugar porque, sem perceberem, tomavam decisões de carreira baseadas no medo. 

Seja o medo de falhar, de perder a estabilidade, de desiludir os outros ou até o medo de arriscar e perceber que “não era aquilo”. 

O problema? O medo não se apresenta de forma óbvia. Ele disfarça-se de racionalidade, de pragmatismo, de lógica. Ele sussurra: 

  1. “O problema não é o trabalho, sou eu que sou demasiado exigente.” 
  2. “Sei que não estou feliz, mas a mudança pode ser pior.” 
  3. “E se eu mudo e me arrependo?” 
  4. “Nem vale a pena tentar, porque o mercado está difícil.” 

Se se reconhece nestes pensamentos, é muito provável que esteja a tomar decisões baseadas no medo, e nem sequer se tenha apercebido disso.  

Afinal, como saber se o medo está a conduzir a sua carreira? Estes são os sinais mais comuns: 

1. Procrastinar constantemente quando precisa de tomar decisões 

Se anda há meses (ou anos) a dizer que precisa de mudar algo na sua carreira, mas nunca dá o primeiro passo, este pode ser um sinal claro de paralisia por análise, um fenómeno psicológico em que o excesso de informação e o receio de cometer erros levam à inação (Kellogg Insight, 2021).  

Quando o medo entra em cena, surgem mil justificações para adiar decisões: “vou esperar mais um tempo”, “preciso de ter mais certezas”, “agora não é o momento ideal” (Kellogg Insight, 2021). 

O problema? O momento ideal nunca chega. E, enquanto espera, o tempo passa, e a ansiedade e o medo de fracassar tendem a aumentar, impedindo mudanças necessárias na sua trajetória profissional (American Psychological Association [APA], 2020). 

2. Focar-se apenas nos riscos e nos cenários negativos 

Já reparou como, quando pensa em mudar algo na sua carreira, a primeira coisa que surge na sua mente são as razões pelas quais isso pode correr mal?: “E se não resulta?”, “E se ninguém me contrata?”, “E se perco a segurança que tenho?”. 

Esse viés de negatividade é um mecanismo natural do cérebro para nos proteger e que pode distorcer a perceção da realidade, tornando desafios normais em ameaças intransponíveis. E quando nos concentramos apenas nos riscos e desvantagens, acabamos por perder oportunidades de crescimento e evolução profissional (Harvard Business Review, 2019). 

O problema não é ver os riscos, o problema é ignorar as oportunidades. 

3. Precisar constantemente de validação externa para tomar decisões 

Se toma decisões de carreira com base apenas no que a família acha, no que os colegas dizem ou no que “parece bem”, pode indicar falta de confiança nas suas próprias capacidades, muitas vezes enraizada no medo de falhar. E falta de confiança nas suas capacidades, advinda do medo de falhar, e de ser julgado, pode levá-lo a seguir caminhos seguros e socialmente aceites mas desalinhados com as suas verdadeiras aspirações (Dweck, 2017).  

No fim do dia, a pergunta que tem de fazer é esta: se ninguém tivesse opinião sobre a sua vida, o que é que realmente queria fazer?  

4. Evitar desafios porque sente que “não está pronto” 

Recusar novas oportunidades ou responsabilidades por receio de não estar à altura pode ser um sinal de que o medo está a ditar as suas escolhas profissionais.  

Isto porque o medo adora convencê-lo de que ainda não está preparado: “Preciso de mais experiência antes de me candidatar.”, “Ainda não domino tudo sobre o assunto.”, “Ainda não é o momento certo.”. 

Mas a verdade? Não é a experiência que nos dá confiança. É a ação. 

E se só aceita desafios quando sente que está 100% pronto, vai perder muitas oportunidades ao longo da sua carreira. Estudos mostram que quem evita desafios por medo de falhar tende a ter menos crescimento profissional e menos satisfação no trabalho (Judge & Ilies, 2019). Quanto mais evita desafios, menos aprende e menor se torna a sua capacidade de adaptação ao mercado de trabalho em constante evolução. 

5. Manter-se numa carreira que já não o satisfaz, apenas pela segurança 

Se há anos sente que algo não está certo, mas continua no mesmo lugar porque “pelo menos tem um salário garantido”, então o medo da mudança e do desconhecido pode estar a ditar as suas escolhas. 

60% dos trabalhadores que permanecem em trabalhos insatisfatórios relatam sintomas de burnout e desmotivação severa (Gallup, 2022). A segurança profissional não deve ser confundida com resignação, pois é possível encontrar estabilidade em carreiras que também oferecem realização. 

A segurança financeira é importante. Mas o que realmente traz estabilidade na carreira não é estar há anos no mesmo trabalho, é ter a capacidade de se adaptar, de identificar oportunidades e de ter estratégias para criar segurança profissional (Gallup, 2022). 

Como superar o medo e tomar decisões mais alinhadas consigo mesmo? 

Tomar decisões de carreira baseadas no medo pode limitar significativamente o seu potencial e satisfação profissional. Ao identificar estes sinais pode implementar estratégias para os superar. Assim colocar-se-á no caminho para construir uma carreira mais alinhada com os seus verdadeiros objetivos e valores. 

O medo nunca desaparece completamente, mas pode deixar de estar no lugar do condutor. Aqui estão algumas estratégias que podem ajudar: 

  1. Invista no seu autoconhecimento: Se não sabe o que quer, qualquer caminho serve. Ganhar clareza sobre os seus valores, interesses e competências ajuda a tomar decisões mais alinhadas consigo, reduzindo a influência do medo. Profissionais com maior autoconhecimento têm maior clareza na tomada de decisões e enfrentam menos arrependimentos de carreira (Goleman, 2018). 
  2. Estabeleça objetivos claros: Definir metas específicas e realistas proporciona direção e diminui a ansiedade associada à incerteza (Locke & Latham, 2019). Quando tem um plano estruturado, as decisões tornam-se mais estratégicas e menos baseadas no medo do desconhecido. 
  3. Pratique a autorreflexão: Reserve momentos para refletir sobre as suas experiências e emoções, identificando padrões de pensamento que possam estar a sabotar o seu progresso. A autorreflexão é uma ferramenta poderosa para quebrar ciclos de medo e insegurança, permitindo-lhe agir com mais confiança (Harvard Business Review, 2019). 
  4. Exponha-se a novas experiências: Faça o compromisso consigo mesmo de todas as semanas fazer uma coisa que seja fora da sua zona de conforto. Não precisa de ser algo grandioso, comece com passos pequeninos. Sair da zona de conforto é essencial para expandir horizontes e perceber que há mais opções disponíveis do que imagina (Harvard Business Review, 2019). 
  5. Procure apoio profissional e rodeie-se das pessoas certas: Ter um ambiente de apoio e partilhar desafios com quem já passou pelo mesmo ajuda a reduzir o medo e a encontrar novas perspetivas (Kellogg Insight, 2021). Programas de mentoria ou de coaching podem oferecer esse ambiente assim como perspetivas valiosas e estratégias para enfrentar medos e inseguranças. Segundo a Kellogg Insight (2021), profissionais que recebem mentoria têm um crescimento de carreira mais rápido e enfrentam menos bloqueios emocionais nas suas decisões. 
  6. Adote uma mentalidade de crescimento: Encare os desafios como oportunidades de aprendizagem, reconhecendo que os erros fazem parte do processo de desenvolvimento. Dweck (2017) descreve que profissionais com mentalidade de crescimento encaram dificuldades como parte do percurso e não como sinais de fracasso, o que os torna mais resilientes às incertezas do mercado de trabalho. E em vez de perguntar “E se não correr bem?”, pergunte-se “E se correr bem?”. 

e tiver que retirar uma única ideia deste artigo, que seja esta… 

Se há algo que aprendi ao longo dos anos, é que o medo não pode ser a bússola que guia a nossa carreira. 

Lembre-se: o medo é uma emoção legítima, mas não deve ser o fator determinante nas suas decisões de carreira. Assuma o comando das suas escolhas e permita-se explorar novas possibilidades com coragem e estratégia. 

O que seria possível para si se deixasse de tomar decisões baseadas no medo? 

 

Referências: 

American Psychological Association (APA). (2020). Understanding workplace anxiety and decision-making. Retirado de https://www.apa.org 

Dweck, C. (2017). Mindset: The New Psychology of Success. Random House. 

Gallup. (2022). State of the Global Workplace Report. Retirado de https://www.gallup.com 

Goleman, D. (2018). Emotional Intelligence: Why It Can Matter More Than IQ. Bantam. 

Harvard Business Review. (2019). Why We Make Bad Career Decisions (and How to Stop). Retirado de https://hbr.org 

Judge, T. A., & Ilies, R. (2019). The relationship between career decision-making and workplace satisfaction: A meta-analysis. Journal of Vocational Behavior, 115, 103321. 

Kellogg Insight. (2021). Take 5: How Fear Influences Our Decisions. Retirado de https://insight.kellogg.northwestern.edu  

Locke, E. A., & Latham, G. P. (2019). A Theory of Goal Setting & Task Performance. Prentice Hall.