“Sempre acreditei que o trabalho era para ser vivido em sacrifício. Quando cheguei estava num sítio escuro, por viver de acordo com esse princípio. Agora tenho clareza, sinto-me capaz e não tenho medo.”

Estas são as palavras de alguém que acompanhei há pouco tempo. Na fase final do seu processo, devolveu-me este feedback. Na verdade, é uma partilha frequente numa fase mais avançada dos processos de acompanhamento. Há de facto uma mudança na pessoa. Manifesta-se na forma como ela se sente, como está nas relações com os outros e nas decisões que toma que a coloca no leme da sua vida profissional. Há um ganho de clarividência, de assertividade e de firmeza em relação ao que se quer e como lá chegar. E é decorrente dessa mudança interna que surgem os resultados, as mudanças externas que tanto desejam. Seja o reposicionamento dentro de uma mesma empresa ou até uma promoção, seja a mudança de papel profissional, seja uma mudança de carreira mais radical ou até o desenvolvimento de um negócio próprio. Apesar de os resultados externos serem diferentes, todos têm origem num ponto em comum: a sua mudança interna!

O que quero dizer, quando falo de mudança interna?

Quando falo de mudança interna, refiro-me a crenças, ou seja, aquilo em que acreditamos. E o que acreditamos traduz-se na forma como pensamos e nos relacionamos com os desafios da vida. Por isso, influencia as nossas decisões e a forma como nos colocamos nas relações.

Repare na primeira frase que a minha cliente partilhou:

Sempre acreditei que o trabalho era para ser vivido em sacrifício”.

Esta era a crença com base na qual esta pessoa navegou a sua vida profissional. Ela não nasceu com esta crença. Adquiriu-a por modelação dos seus pais. Os seus pais viveram as suas vidas profissionais em grande sacrifício para assegurar que tinham o dinheiro suficiente para criar os seus vários filhos. Ao ponto de exigirem que estes se tornassem independentes e saíssem de casa aos 18 anos para serem autossuficientes. Foi uma vivência muito intensa e marcante que se enraizou nesta pessoa.

Então cumprindo com a exigência que lhe foi feita desde cedo, partiu para a sua vida profissional com um único foco em mente: ganhar dinheiro para subsistir a todo o custo, tal como lhe foi ensinado pelos seus pais!

Conseguiu tirar a sua licenciatura ao mesmo tempo que trabalhava, pois só podia contar consigo própria. Foi fazendo a sua vida profissional, sempre a perseguir o mesmo foco. Agora, com uns bons anos de percurso feito e com uma família constituída viu-se numa situação profissional em que a entidade empregadora exigia sem parar porque tudo era urgente e importante. Esta profissional acreditava que para ser merecedora do seu vencimento teria de entrar em modo ‘auto sacrifício’ e por isso fez o possível e o impossível para dar resposta. Chegou ao ponto de se tornar praticamente ausente para a sua família. Só parava para dormir e, pouco! Claro, só parou quando chegou ao burnout. Só aí é que colocou a hipótese de que talvez a forma como estava a lidar com a sua vida profissional pudesse ser um problema. Que a forma como se estava a posicionar nas relações lhe trazia estabilidade financeira, mas instabilidade emocional e física. E é assim para muitos de nós. Só quando batemos no fundo é que paramos para reflectir e colocar a hipótese de que talvez estejamos a abordar de forma errada o tema. O simples facto de se colocar em causa, abre o espaço para a tal mudança interna. A mudança das nossas crenças.

“Somos o que pensamos. Tudo o que somos surge com os nossos pensamentos. Com os nossos pensamentos, fazemos o nosso mundo.” BUDA

Eu própria passei por isso. Fui educada, tal como tantos outros da minha geração que o trabalho é para ser vívido em sacrifício e que isso implica fazer o que nos mandam e não colocar em causa. É como anuncia aquele dito popular, se trabalhar fosse bom não nos pagariam para isso!

Consegue perceber o quanto este tipo de crenças nos afecta? É que lidamos e suportamos situações que nos são prejudiciais. Eu, ao contrário desta pessoa que acompanhei, não entrei em burnout, mas desenvolvi uma doença autoimune. Tal era a violência que estava a impor a mim mesma ao longo de anos. Tudo porque tinha a certeza que era suposto ser assim. E se eu não aguentasse, era porque era fraca, impostora ou incompetente. Porque foi assim com os meus pais. Viveram toda a sua carreira dessa forma. A todo o custo, desde que em troca recebessem o seu vencimento. Conto em detalhe este episódio da minha história no livro Quero, Posso e Mudo de Carreira (descarregue a amostra gratuita e afira por si próprio(a)).

Estou a dar o exemplo desta crença que leva a que as pessoas vivam durante anos em situações de grande esforço e sacrifício, mas existem muitas outras crenças mais particulares ou mais globais que nos afectam e que nos foram incutidas:

  1. Se digo o que penso, sou castigado(a) e por isso não posso falar muito ou só posso dizer aquilo que os outros querem ouvir,
  2. A segurança vem de fora, daquilo que o mercado de trabalho pede e só tenho de ir atrás disso e estou garantido(a) e por isso vou ser feliz!
  3. Para ter uma carreira de sucesso tenho de ser promovido(a) com frequência e chegar ao topo!
  4. Só posso almejar uma promoção ou uma ascensão profissional se souber fazer muito bem o meu trabalho técnico e este for reconhecido,
  5. Não posso mudar agora, que isto está mau!

E a lista poderia continuar…

Perante esta lista talvez lhe seja evidente o quão estas crenças o(a) possam estar a afectar negativamente. Mas também pode não ser evidente, por isso descrevo o que por norma acontece com quem tem cada uma das crenças que acima enunciei:

  1. A pessoa guarda para si contributos relevantes, acabando muitas vezes por mais adiante aperceber-se que tinha razão. Só que como tende a inibir a afirmação de si, as pessoas com este tipo de crenças tem menos probabilidade de serem escolhidas na hora de se promover alguém. Por outro lado, vivem diariamente em contenção porque têm opiniões diferentes. Discordam muitas vezes dos decisores, acabando por se desalinhar com a sua equipa, chefias e até por sair mais tarde porque não exerceram o seu poder de influência.
  2. Ir atrás ‘do que está a dar’ é a opção de muitos para terem segurança financeira. Com essa escolha ignoram a pessoa que são e os interesses que têm e vêem-se aprisionados numa vivência diária totalmente desmotivante e apática. Sentem-se verdadeiros autómatos, sem proactividade e vontade de trabalhar, passando a maior parte do tempo a tentar viver a vida em exclusivo nas férias e nos sins-de-semana, tentando esquecer a vivência que levam no quotidiano.
  3. Muitas vezes a pessoa acredita que só vai ser feliz e reconhecido como um caso de sucesso quando chegar ao topo. Já perdi a conta ao número de pessoas que me disseram ‘cheguei ao topo e não havia lá nada!’
  4. Esta crença advém do modelo educacional escolar. Se formos aplicados tiramos boas notas. No mundo do trabalho não é assim. É claro que a competência é importante, mas se está à espera que só porque faz bem o seu trabalho técnico está garantido, desengane-se e prepare-se para lidar com a frustração quando um colega que não é tão competente for promovido em vez de você. É que para termos os resultados que queremos na carreira precisamos de desenvolver muito mais dimensões do que saber fazer o trabalho técnico. Saber gerir relações interpessoais e conquistar a confiança dos outros é determinante, se quer ter possibilidades novas.
  5. Aqui assume que se o mercado está mau e tem um emprego agora não irá ser afectado. A verdade é que provavelmente já está numa situação que não o serve há muito, mas por causa da estabilidade financeira, está a escolher viver em sacríficio até ver. Sem saber, está a correr o risco de sentir cada vez mais dificuldades em lidar com a situação actual, com propensão a tornar-se reactivo e tóxico para com os outros em seu redor. Além disso quero relembrar-lhe que não há empregos vitalícios!

Creio que por esta altura já percebeu a ideia, não é?

Todos temos crenças que limitam a nossa possibilidade de sermos realizados profissionalmente e alcançar o que desejamos. Se quiser ter uma mudança na sua vida profissional, terá de substituir essas crenças por outras que sejam potenciadoras dos resultados que pretende.

Como pode fazer isso?

O primeiro passo é escrever exatamente o que pretende alcançar na sua vida profissional. Isso mesmo. Escreva. Passados uns dias releia para perceber se é mesmo isso que pretende e ajuste até estar totalmente confortável com o que descreveu. Existem inúmeros estudos que evidenciam que a probabilidade de alcançarmos o que nos propomos aumenta quando temos clareza e o descrevemos de forma exacta. É uma forma de estarmos conscientes e sermos intencionais nas nossas escolhas

O segundo passo, será listar todas as crenças limitadoras que o inibirão de alcançar o que deseja. Ou dito de outra forma, o que pensa sobre si e sobre a situação que o impedem de alcançar o que pretende.

Para cada uma dessas crenças/pensamentos responda por escrito às seguintes perguntas:

  1. Até que ponto essa crença me irá permitir alcançar o que pretendo?
  2. A pessoa com quem aprendi esta crença pode ser tomada como modelo nos objetivos que quero atingir?
  3. Quais são os custos e danos que irei ter emocionalmente, fisicamente, financeiramente e em termos de relações se não me livrar desta crença?

Se tirar tempo suficiente para fazer este exercício, perceberá o quão importante será de se libertar dessas crenças.

O terceiro passo será substituir cada uma das suas crenças limitadoras por crenças potenciadoras.

Se tal como a pessoa que acompanhei tem a crença que o trabalho é para ser vivido em sacrífico, pode descrever qual a nova crença que quer adoptar para neutralizar a anterior. Por exemplo, ‘é possível viver o trabalho com gratificação e interesse’.

Para começar a acreditar nesta nova crença precisa de recolher evidências de que isso é possível, através de histórias de outros que vivem de acordo com esta crença. Nesse sentido, ouça o nosso Podcast que está repleto de testemunhos alinhados com esta crença positiva.

Outra coisa que pode fazer é identificar pessoas que já alcançaram o que você deseja e descreveu nos seus objetivos. Procurar essas pessoas e perguntar-lhe em que é que a pessoa acreditou que alavancou esses resultados.

Em síntese,

Se não está a obter os resultados que quer para a sua vida, precisa de colocar em causa as crenças pelas quais se tem regulado. É aí que começa a mudança. Em si!

Só depois de realizar mudanças essenciais em si, é que é relevante endereçar o mundo exterior e gerir as diversas variáveis presentes e nunca o contrário.

É isso a que se chama redesenhar a sua vida de dentro para fora!

Recursos consultados para este artigo:

  • “Desperte o gigante que há em si. Como controlar a sua mente e a sua vida emocional, física e financeira.” Anthony Robbins.
  • “Quero, Posso e Mudo de Carreira”. Lourdes Monteiro e Alexandra Quadros.
  • Podcast “Quero, Posso e Mudo de Carreira”. Lourdes Monteiro e Alexandra Quadros