Muitas vezes, a história começa assim:
– ‘Eu abracei esta função, mas sinceramente não me revejo neste ambiente. Quem gere só se foca em números e processos. A cultura é muito agressiva, há muita pressão. As pessoas com quem trabalho parecem viver confortáveis com esse ‘modus operandi’ e não fazem nada para influenciar mudanças. Já eu não me conformo. Será que eu é que tenho um problema?
Complementada com outros ingredientes como:
– ‘O trabalho tornou-se muito repetitivo. Entrei em piloto automático. Não me sinto a evoluir, nem estou a aprender. Poderia melhorar-se a eficiência e a qualidade. Mas esses aspectos não parecem ser importantes na empresa. Gostaria muito de estar mais envolvido quando as coisas se estão a criar.’
E/ou ainda:
– ‘Deixei de ter vida. Eu não quero continuar a chegar ao final do dia extenuada e sem energia para fazer outras coisas que são importantes para mim. Não tenho disponibilidade mental e emocional para o meu filho. Quando saio com os meus amigos dou por mim a queixar-me do trabalho. Que espécie de vida estou eu a levar? E pior, em que espécie de pessoa me estou a tornar?’
Revê-se nestas partilhas?
Deixe-me dizer-lhe que está longe de ser o único!
Esta é na verdade a narrativa mais frequente que ouço de pessoas da geração Milénio (pessoas que tem hoje entre 24 e 38 anos) quando se referem à sua experiência no local de trabalho.
Há cinco anos que facilito processos de Career Redesign® e verifico que 60% das pessoas que vêm ao meu encontro são pessoas da geração Milénio. Invariavelmente começam por partilhar os motivos da sua insatisfação, descrevendo-os de forma idêntica à que aqui lhe apresento.
É claro que poderiam ser pessoas de qualquer geração. Também acontece. Mas, o que observo com maior frequência nas pessoas de outras gerações, é que existem para além destes, outros factores preponderantes que agravam o sentimento de insatisfação, como por exemplo a adequada falta de reconhecimento, o desalinhamento da actividade com os interesses que entretanto se alteraram ao longo da vida, conflitos com pares ou com hierarquias, entre outros.
O que me chama a atenção, ao ponto de decidir escrever este artigo é a extraordinária similaridade das histórias contadas por ‘estes Millennials’. São testemunhos de diferentes pessoas, com histórias de vida distintas, de diversas geografias, com formações variadas e contudo a mesma percepção sobre a sua experiência no trabalho. No mínimo dá que pensar…
Outro aspecto que também noto é que ao contrário de pessoas de outras gerações, as quais vivem diversos anos com uma insatisfação latente, ‘estes Millenials’ ao fim de alguns meses e na pior das situações após 1 a 2 anos de insatisfação decidem passar à ação. Não aceitam o veredito. E acreditem que aqueles que os rodeiam apelam à sua prudência, afirmando que o importante na carreira são as ‘condições contratuais’ e não a satisfação e o impacto que possam provocar. Mas mesmo assim, ‘estes Millennials’ persistem na busca de respostas. Das suas respostas. Não das respostas que os outros esperam deles.
São também várias as formas através das quais passam à ação. Desde saltitarem de empresa em empresa para experimentar outros ambientes, a criarem os seus próprios empreendimentos, a viagens à volta do mundo para se descobrirem…
Veja exemplos, disso aqui.
Mas há aqueles que partem em busca de apoio para reflectir sobre a sua vida profissional. É com ‘estes Millennials’ que eu trabalho e com os quais aprendo.
Têm em comum, saberem de forma muito clara o que não querem e o que os incomoda. Mas também a capacidade de se porem em causa.
Quando procuram ajuda, pretendem:
– Gerir o risco das suas decisões,
– Fazer escolhas assertivas, em vez de andarem constantemente em tentativa-erro,
– Colaborar com entidades que contribuam para uma causa com a qual se identifiquem ou que tenha os mesmos valores que os seus,
– Flexibilidade no trabalho e equilíbrio pessoal / profissional,
– Obter uma remuneração que suporte o seu estilo de vida.
Isto é o que procuram.
Muitos verbalizam: ‘No fundo, o que eu quero é um trabalho onde me sinta feliz e possa contribuir!’
E o que acontece durante os processos de reflexão sobre o seu papel profissional?
Quase sempre as pessoas chegam reactivas. Apontam o dedo aos que estão em seu redor. Culpam-nos do estado no qual se encontram. Não tendem a avaliar a situação considerando a sua parte de responsabilidade. Contudo, numa reflexão assistida, muitos são aqueles que se apercebem de que estão a corresponder ao padrão que eles próprios criticam. E o que geralmente fazem? Afastam-se. Separam-se da entidade.
Só que ao fazê-lo, correm o risco de perante obstáculos idênticos, noutro contexto, voltarem a viver situações das quais fugiram. Só que agora, noutra morada. Isto acontece com muita frequência, é a tal abordagem tentativa-erro que referi acima.
O que é contudo interessante observar para lá desta impaciência e exigência da parte ‘destes Millennials’, é que quando são escutados e apoiados no seu processo de reflexão, alavancam recursos extraordinários para lidarem com as situações. São capazes de se adaptar e de se tornar proactivos. A prova disso mesmo, é que muitos deles acabam por abordar de forma assertiva pessoas chave nas organizações. Ao fazê-lo de forma reflectida e objectiva, conseguem muitas vezes influenciar novas perspectivas nos decisores, podendo ser correspondidos em alguma medida. Quando isso acontece, sentem-se orgulhosos de si. Sentem que foram capazes de influenciar a organização e de abrir espaço para fazer o seu caminho. Por seu lado, as entidades conseguem retê-los e a relação de confiança sai fortalecida.
Porém, o que faz verdadeira diferença, é quando ‘estes Millennials’ se dedicam a aumentar o seu autoconhecimento. Angariam no decurso desse exercício uma maior serenidade. Compreendem as suas forças, os seus interesses e os seus drivers de actuação natural transformando-os em modelos de valor para a sociedade, comunidade ou empresas nas quais se encontram inseridos ou nas quais pretendam estar no futuro. A partir daí, compreendem melhor quem são, quais podem ser os seus papéis e como os podem desempenhar.
Por isso, é minha opinião que uma abordagem de coaching para com ‘estes Millennials’ é crucial.
Da minha experiência, verifico que quando os Millennials vêem caminhos possíveis que permitam a sua expressão, com potencial de impacto positivo, são capazes de ser exemplos inspiradores para qualquer um de nós apesar de tantas vezes serem rotulados de egocêntricos e impacientes. Inspiram-nos principalmente se nunca tivemos a coragem de simplesmente parar e pedir ajuda para reflectir sobre algo tão importante como o nosso bem-estar no trabalho!
Em síntese,
Se você for um Millennial compreenda que a impaciência irá à partida levá-lo a comportamentos de fuga. Prefira aprofundar o conhecimento de si e munir-se de ferramentas para agir de forma assertiva.
Se você gerir Millennials aposte em escutá-los e compreendê-los verdadeiramente. Partilhe com eles a sua experiência e apoie-os assumidamente. Vai ver que ao fazê-lo são muitos os benefícios que a médio prazo irão nascer.
É caso para se dizer que mais vale incomodados do que impacientes!